sábado, janeiro 05, 2013

Já não cora a Maribia...


Nos anos sessenta e poucos, Maribia fora entregue aos cuidados da menina Geninha como aprendiza de modista, sem qualquer alternativa. “Vais e vais mesmo, eu é que sei!”

Ao fim de dois meses, Maribia tratava das brasas para o ferro de passar, desalinhavava o dia inteiro e no final, por ser a mais nova, varria o chão da casa de costura, cumprindo à risca, sempre à risca, que a menina Geninha não era para brincadeiras: “Moça, linhas para um lado e alfinetes para o outro!”

Mais lhe apetecia brincar do que estar ali naquela prisão, de manhã até à tarde. Ela, ainda a começar, e as outras duas, a Fernanda e a Conceição, já ajudantas e com direito a soldo variado, consoante o serviço. Ouviam rádio só aos bocadinhos, e baixinho, para não gastar muito a bateria: o folhetim e os Parodiantes, mas música nada, cantavam elas e alternavam com conversetas e anedotas picantes que a faziam corar. Corava sempre, e então quando as outras mangavam com ela por não perceber os contornos das historietas sussurradas entre dentes, ainda mais vermelha ficava. Aqui, a menina Geninha vinha em sua salvação com um daqueles “Chiu meninas! Deixem a mecinha em paz, que tem tempo!”

Havia sempre visitas, freguesas para medidas ou provas ou apenas visitas, que se demoravam num traz-e-leva e diz-que-disse. “É como no João Barbeiro! Há por aí munta gente a falazar!”, contestava o pai dela, o Joaquim Borrego, trabalhador à jorna e sempre contra tudo. No dia 5 chegava o Figurino com os novos modelos, juntamente com a coleção das amostras dos Armazéns do Norte, o que atraía mais senhoras. Entre suspiros de “ai que lindo!” ou de “não me ficava tão bem?” entravam e saíam as madamas, não antes de se inteirarem ou deixarem o caso do dia, ou da semana, ou mais algum episódio do Dr. Rodrigo que dava traques pela rua, ou da sua Mariazinha, uma oferecida, e que andava no coisital com o Luís da farmácia. Maribia, na inocência dos seus treze anitos, não percebia muito bem o que era e não lhe queriam explicar, mas aquilo era falar mal, com certeza.

– Maribia, vais à loja e trazes quatro metros de fita estrafor preta. – mandava a menina Geninha. Perguntas à Leninha se as minhas meias já estão prontas. Dizes que eu depois mando pagar.

— E volta depressa que ainda tens de ir ao despacho entregar uma encomenda para a Joanita das Alfambras.

E logo as outras duas lhe atiraram, entre dentes: – Vais ver o Ruizinho lá na loja. – Vê lá, não te distraias e não te enganes na fita. Olha o catrapisco, hem!

O Rui era filho da dona da loja. Tinham andado juntos na escola e nessa altura eram vizinhos. Às vezes brincavam juntos, mas agora ele estava em casa das tias em Portimão, a estudar, e só se viam nas férias. Toda a gente dizia que eles se namoravam, coisas de miúdos, mas era mais uma daquelas coisas que a faziam corar, sentia logo o calor nas faces. A menina Geninha já lhe tinha dito que não se apoquentasse, que com a idade ia passar, que afinal não era assim tão mau, pois a Conceição e a Fernanda, na hora de saírem, davam beliscões na cara só para ficarem com umas corzinhas.

Saltitando ladeira abaixo e depois pelas escadas do mestre Pedro Afonso, chegou à loja das meninas Margaridas. Estavam pessoas a ser atendidas e teve de esperar. Reparou que o Rui estava ao canto do balcão a ler um livro de quadradinhos, já com o olhar fixo nela. Corou outra vez e ficou com o coração acelerado. Disse-lhe um “Olá!” tão sumido que mais ninguém ouviu, a que ele respondeu da mesma maneira. Ficaram se olhando assim, tão embevecidos, que nem ouvia a menina Margarida a chamá-la.

– MariaBia, então hoje o que é que temos? O que é?

Quando retomou as escadinhas, logo na primeira travessa, saiu-lhe o Rui ao caminho e, sem aviso nem conlicenças ali lhe deu um beijo fugidio na face vermelha. Fixaram-se por uns segundos, uma eternidade, até que ela desatou a correr pelas escadas acima.

*

É dia de procissão da Nª. Srª. D’Alva. As festas são no largo da Igreja Nova, com quermesse, um palco para espetáculo e esplanada para petiscos, com mesas e cadeiras para se assistir às variedades. Os prospetos diziam que vinham uns artistas de Lagos e o Joãozinho do Rogil com o seu acordeão, para o baile do costume.

Maribia era agora a ajudanta principal e que já tomava conta da oficina, aliás atelier, como dizia o anúncio que a menina Geninha mandara pendurar na janela. Revelara-se com um jeito especial para o corte, cujo diploma tirado em Lagos, na Singer, estava emoldurado na parede, e duma perfeição, que as madamas só queriam que o toque final fosse dado por ela.

– Olá Maribia! – uma espécie de murmúrio tão perto do seu ouvido. – Dás-me sorte com os teus bilhetinhos? Quero vinte e cinco tostões deles.

Hoje, nas festas, fazia um turno na quermesse. Olhava de frente, quase desafiando, os rapazes que faziam bicha para comprarem os bilhetes a ela. Já não costumava corar tanto… mas corou.

– Olá Rui! Podes crer, se comprares do meu cestinho vais ter um prémio. Estendeu-lhe o cesto com o coração acelerado e as pernas a tremerem.

O Rui tirou os bilhetinhos e desenrolou-os, lentamente, gozando o momento – Tinhas razão, saiu-me o 20! O que será?

Era uma moldura, brilhante, com uma daquelas fotografias.

O Rui ofereceu-lha. – Fica para ti, acho que lhe vais dar melhor uso que eu. É uma coisa mais… feminina. Faz de conta que esses… somos nós os dois. O que é que achas?

Lá estava ela a corar outra vez, mas encheu-se de coragem e olhou-o nos olhos. – Obrigada, aceito. Vou pôr uma fotografia minha e…– hesitou e desafiou-o – fico à espera da tua, para lhe juntar.

– Está bem, vou-ta mandar. – E pousando a sua mão sobre a dela, deixou-lhe um “espera por mim”, e desapareceu com os seus amigos.

*

Ele foi para os Fuzileiros na camioneta da manhã seguinte. A fotografia, a preto e branco, chegou três meses depois. Estava fardado e segurava numa das mãos um cachimbo. Ficava-lhe tão bem o cachimbo… ”Com a amizade do Rui” lia-se na parte da frente e, na parte de trás, um comprometedor “Espera por mim” dentro de um coração.

*

O Rui embarcara para a Guiné. Escreviam-se, ela era a sua madrinha de guerra. Era o que dizia, mas na verdade o que sentia era diferente. E ele também. As cartas começavam sempre por “Minha querida Maribia” ao que ela respondia com “Meu querido afilhado”. Na verdade, ambos achavam que já se namoravam. Faziam planos para quando ele voltasse, iriam morar para a Cruz de Pau, ou para o Feijó, e ela abriria em sua própria casa um atelier de costura para outras madamas, e teria as suas aprendizas e ajudantas.

Ficou-se o futuro no sonho. O Rui desaparecera em combate. O não aparecimento do corpo ainda lhe alimentou esperanças, que o fim da guerra fez renascerem. Mas em vão os meses se tornaram anos, e estes quase uma vida.

A Maribia ainda espera o Rui. O seu Ruizinho de olhar sereno, segurando o cachimbo que lhe dava um ar tão fino…

sábado, dezembro 29, 2012

Cantar as Janeiras e os Reis

Não é apenas o Barlaventino que busca  e rebusca as peças da história, a Antena 1 (não passe porque merece a publicidade) reeditou hoje mais um saudoso Lugar ao Sul, desta vez visitando Aljezur em 1998, revelando a Maria Bárbara (e o Amador), a Bia Margarida, a Graciete, a Balbina e a Laurinda, a recordarem os cantares de Janeiras e dos Reis, doutros tempos.
Aqui fica, para não perder (enquanto durar).

http://www.rtp.pt/play/p650/e103406/lugar-ao-sul-reedicao

sexta-feira, dezembro 07, 2012

Figuras da Terra

Isabel Vitorino

Deixou Aljezur há muitos, muitos anos. É pequenina mas isso não quer dizer nada, saltou para a ribalta com cassetes e CDs. De 1990 "A Baixinha do Fado" levou-a ao conhecimento de muita gente, mas hoje, infelizmente, mal se ouve.
Por onde andas, Marizabel?

Tem presença no YouTube, vamos ouvê-la aqui!

sábado, outubro 13, 2012

Os Bruxos da Corte Cibrão

A folha 19.694




‑ Não acreditas, não acreditas, mas devias ir – insistia o Zé Leonel. – Há coisas que nunca se sabe… Vai lá que eu vou contigo.
‑ Ò pá, Zé! Vou lá fazer o quê, não me dizes? O senhor Joaquim deu-me as sebentas e eu vou usá-las, não? Olha esta, começa em 19.651 só porque me apeteceu, e vou lá escrever também o que me apetecer. Olha ò caraças!
‑ Sim, como te apetecer, mas se queres escrever como deve ser, devias ir lá falar com os gajos, ‑ o Zé Leonel voltava à carga, ‑ li num sítio que isso é importante. Amanhã era bom, é dia 13.

E lá fomos à Corte Cibrão, no caminho de Marmelete.
 
Que dia aquele! Tenho-o registado como se ontem fosse e, no entanto, já lá vão uns belos anos. Naquele tempo eu tinha o hábito de numerar as páginas dos meus cadernos (sebentas) começando num número qualquer, geralmente elevado e sem repetições, para dar a impressão que escrevia muito, e nesta aparece uma folha com este curioso número 19.694. Curioso e especial, porque segundo os presságios dos pobres bruxos da Corte Cibrão, os dois velhos pai e filha nele viram os ziguezagues do meu destino e por ele me traçaram um raio de futuro. Levei-lhes naquele dia um caixotinho cheio de sebentas e cadernos em branco, mas já com as páginas numeradas para contrariar qualquer eventual desejo de anular escritos repesos. A ideia do Zé Leonel era que eles "protegessem" os meus desabafos com as suas sábias evocações anti-desgraça.


O Bruxo de Corte Cibreira
Eles folhearam e folhearam demoradamente, concentrados no vazio das folhas, e como se consultassem os espíritos detiveram-se nesta página. Bruscamente o velho agarrou uma pequeníssima bolsa de pano que trazia ao peito, parecendo buscar nesse amuleto a ajuda para conseguir ler nessa página o que muitos anos depois eu lá pudesse escrever, e olhou-me fixamente com os olhos semicerrados.



Eu era um valente cavaleiro de bicicletas nos meus quinze anos, e pelos bruxos só sentia uma espécie de curiosidade que a minha tia Emília constantemente me aguçava com as suas benzeduras e os seus “olha que dá azar”. Mas naquele momento o meu coração acelerou e temi. Dissimuladamente fiz figas. O Zé Leonel nessa altura enganchou o seu braço no meu, como a fortalecer a nossa união frente a algum quebranto ou andaço que pelos ares viesse. Mas não, foi apenas uma espécie de sina (aliás, havia até quem dissesse que estes dois eram, afinal, mais adivinhos aciganados do que bruxos).

E sempre veio a sina…

“Menine, em prumêres, ‑ me recomendou o velho,‑ nada de dares este númaro a nenhuma das folhas dos teus escritos; até devias era rasgá-la;
Sigundes, em escrevendo uma em cada dia, já vais ser velho quando cá chegares a esta folha e…;
Torceros, os quatro prumêros númaros são do ano em qu’hádes ser mancebo (naquele tempo aos 21 anos);
E despoje, o númaro quatre é o teu mês das sortes, hádes sentar praça em abrili nas tropas das Cavalarias;
Maje ainda, o númaro um qué dzê q’um ano despoje hádes ir pra uma guerra;
E vê-se na soma dos númaros de 1969 o dia desse mês, outra vez abrili, em qu’hádes partiri.
E revirando os olhos ainda continuou com as contas ‑ … nove e um dez, noves fora um, um e seje faz seti, com novi  faz dezaseje, noves fora seti, com quatre faz onzi, noves fora doje. Poj’é Chico, a tua ida à guerra vai fazer sofrer munto duas pessoas… deixa veri… sim, um és tu mesmo, vai-te a doer o pêto de partires, a outra pessoa há de ser… uma moça, seja ela quem for. E na te posse dzê maje nada!”
Mas ainda balbuciou qualquer coisa que mal percebi: " - ... se vais a começar… outubro de 2017… se não sabias ficas a saber, o mundo acaba na volta do século… e todos vão pagar… é o pocalipes“.
E assim acabou. Fez um sinal para que lhe deixasse a paga sobre a tosca mesa de castanho, velha e suja, e recolheu-se para a escuridão da outra metade casa, separada da entrada por serapilheiras cosidas, penduradas num varal.
A filha agarrou-me no talego e empurrou-nos para rua com o caixote das sebentas. Respirámos fundo, eu o Zé Leonel, e sem mais palavras montámos nas gingas e pedalámos ladeira abaixo até à Fonte da Azinheira. Só aí parámos para nos refrescarmos e acordar daquele “sonho”.

*

Passados tantos anos ainda mantenho essas sebentas, ou quase todas. Perdi essa mania da escrita diária, obrigatória, e muitas delas acabaram sendo usadas para coisas de escola, minhas e dos primos.
Hoje, fim de semana de arrumações, é preciso criar espaço para mais uns livros que se foram acumulando, e sai em cena uma velha caixa de cartão no cimo dum armário do sótão. A caixa das sebentas! E lá estava a sebenta número 13, a tal com a folha 19.694, completamente inutilizada com um grande X a vermelho. Naquela altura havia qualquer coisa... um misto de respeito e medo, ‑ a crendice generalizada fazia parte da nossa obscura matriz sociocultural, ‑ que me atordoava os sonhos e me levou a inutilizar a dita folha com aquele gigante X que risquei a lápis grosso.
Nunca mais me lembrara desse episódio, mas agora recordei pormenorizadamente a história da minha ida aos bruxos da Corte Cibrão. A casa mal iluminada. A cara do bruxo-velho, pele curtida e enrugada pelos muitos anos ‑ mais de cem, diziam ‑ , olhos pretos, frios, encovados, a boca sem dentes que lhe fazia sobressair o queixo e lhe dava aquela fala esquisita. Até o cheiro dumas ervas quaisquer que a bruxa-filha deitara nas brasas eu parecia senti-lo agora.

Não, não, hoje já não sou supersticioso e por isso decidi usar a famigerada folha 19.694 para nela escrever este reviver de há cinco décadas. Sem medos nem mistérios. Apenas porque sim.
Mas e as datas!? É verdade, as datas coincidiram! Menos o fim do mundo... Mero acaso?! Não, não, não sou mesmo supersticioso... pèro que las hay, las hay!

 

domingo, julho 01, 2012

Lá por trás

Esta vila tem sítios cuja designação, por mais natural que nos pareça a nós, que já nascemos com eles, não deixa de parecer estranha a muita gente, sobretudo às pessoas de fora. Acho que a toponímia é assim mesmo em quase toda a parte. Um desses sítios é o “Lá por trás”.
(Descida pelo antigo Hospital da Misericórdia)
Na nossa juventude esse era um dos locais onde as brincadeiras se abriam para horizontes infinitos. Com salpicos de sabores variados, já que as várias hortas eram generosas; lá passa a ribeira, convidando à banhoca, com bons pegos para mergulhar e a ponte de pau para saltar ou, como tanto gostávamos, os ramos dos chorões donde, gritando que nem Tarzan-Weissmuller, nos pendurávamos para as acrobacias no meio dos crocodilos da nossa imaginação.
Também de “Lá por trás” provinham os ataques ao Castelo, imitação imaginada da tomada da vila: os exércitos das tropas de Sant’Iago (nós, a moçada das Cabeças), reuniam acoitados nos desníveis do terreno para definir a estratégia e as hierarquias, e amarinhando a encosta — pelo meio dos favais ou da cevada – conforme a época — dando vivas a El-Rei, galgavam a muralha arruinada para destroçar a moirama à espadeirada com varas de marmeleiro e copos de cortiça, acabando por desfraldar um trapo vitorioso no alto da cisterna conquistada.
(Trepar para a conquista!)
Disse que já nascemos com estes sítios, efetivamente. Ainda pequenotes e sem saber andar, já as mães nos levavam quando iam lavar à ribeira: o mecinho num quadril, o caixote com a roupa e o sabão no outro. Cedo portanto aprendemos o caminho. E com meia dúzia de anos já nos aventurávamos pela ladeira do hospital abaixo, explorando para lá do velho portão que nos franqueava a entrada até ao moinho d´água, território do nosso amigo Zé, o Zé do Moinho. A distância das nossas casas até ao portão era insignificante, no entanto bastava para marcar a diferença entre ser da vila e ser do campo. Diferença essa que se vinha a notar mais na escola primária, onde os nossos amigos do campo chegavam já estafados, mais do trabalho e das madrugadas com o gado que da distância, uma vez que bem cedo, no tempo e na idade, tinham atribuídas tarefas como se adultos fossem. Era gostosa a partilha de experiências entre nós! Ir aos ninhos, armar aos pássaros, apanhar pintassilgos nos bebedouros da ribeira, técnica que depois aplicávamos na eira da Barrada, no meio dos roleiros, nos tempos da debulha do trigo. Ou então partir a caminho das Índias em barquinhos de casca de pinheiro que saíam do Açude e seguiam pela vala, contornando o monte do Forte, até à azenha do Zé do Moinho onde às vezes nos esperava uma bela fatia de pão caseiro com manteiga encarnada.
(A Fonte das Mentiras - Restaurada!)

É também “Lá por trás” que fica a Fonte das Mentiras, tétrica, medonha. Saíam ali os Mouros, ou entravam… Era sempre um arrepio na espinha. Só pelos meus doze anos perdi os receios e afoitei-me a espreitar lá para dentro: pouca água, suja e com rãs!
À beira da ribeira, no sítio onde curvava, eram as pastagens em terras enlameadas, e charcos para a cultura de arroz. Pelos combros desses charcos corríamos alegremente e costumávamos procurar cobrinhas de água para nos entretermos com algumas maldades, ou até para levarmos para a escola e assustar as moças, e fazer a senhora Marcolina perder a cabeça e distribuir ponteiradas a torto e a direito.
Era também “Lá por trás”, a caminho do Vale Palheiro — outros pelos lados de S. Pedro —, que alguns anos mais tarde nos organizávamos para apanhar rosmaninho para as fogueiras dos santos populares ou para as festas da igreja. Aí, já mais espigadotes, formávamos ranchinhos de moços e moças, que rapidamente nos dispersávamos em pequenos grupos (ou mesmo pares, quando tal era possível), para a quatro mãos puxarmos as ramas das plantas e arrancá-las, o que frequentemente resultava (ou se provocava) em rebolanços pelo declive proporcionando inusitados e furtivos contactos. Dessa forma se cursavam os caminhos de iniciações várias, algumas delas conduzindo a uniões que se consolidaram ao longo dos anos.
(Lá por Trás... do castelo até ao Mar)

Este “Lá por trás” é um vale amplo, com uma ribeira-rio a caminho do mar da Amoreira. Ribeira que fertiliza os campos do Vale Palheiro, do Vale de D. Sancho, do Monte da Amoreira e outras terras que, com toda a propriedade, já tomam o nome de Salgados, para lá do ponto onde a ribeira se alarga e se abre ao sal das águas do mar… e é o rio, das liças e robaletes, dos berbigões e langueirões, das dunas e areões dourados… das nossas recordações.

domingo, abril 01, 2012

A (outra) Banda de Música de Aljezur

Aqui retomamos a Banda de Música de outros tempos, com os jovens de então, muitos deles já na embarcados na última viagem.

Banda famosa e disputada para festas em muitos sítios do Algarve: algumas excursões (de burro, claro) para irem abrilhantar festas ou completar bandas locais com falta de elementos, levaram a sua representação até ao Alferce e, mais longe ainda, Santa Margarida da Serra. No Alferce cheguei a assitir ao reecontro com antigos músicos da terra a recordarem essas viagens, à roda do genuíno medronho da serra - tão bom para aquecer como... para assar umas chouriças.

Eis a Banda no ano de 1935:


E os artistas eram:
ÚLTIMA FILA (da esquerda para a direita)

(1) Francisco Vicente do Nascimento (2) António Alves Marreiros (3) António Batista (4) Joaquim Luz Rita (5) Albertino da Costa Marreiros (6) António Silva Gambôa (7) José Eduardo Sobral (8) Manuel da Costa (9) Lázaro Afonso Costa (10) José dos Santos Figueiredo (11) António Duarte (12) João Furtado

PRIMEIRA FILA (da esquerda para a direita)

(13) Arnaldo Duarte Talisca (14) Francisco Fernandes Costa (15 - Bombo) Pedro Gonçalves Gambôa (Mestre Pedro Afonso) (16) César Augusto Laranjo (17) Frederico Furtado Júnior
(18) Frederico Furtado – maestro (19) Fábio Gomes (20) José António Claro (21) José Talisca (22) Albertino da Costa Rafael (23) Valentim Andrade Cardeira (24) António Duarte Talisca (25) António Viana Gonçalves (26) Francisco Pereira Gambôa (27) Noé Rodrigues Gambôa

Fonte: João Costa, em 1998.

domingo, março 04, 2012

Al-Mu'tamid

Oh! Que pena poeta não ser... Como hei-de superar esta incapacidade para pôr por escrito o que por dentro sinto? Não me ajudam as mãos nos gestos necessários, nem os vocabulários me apontam as palavras a usar...
Embora não sendo poeta, não é por isso que amo menos a poesia. Decidi pedir "emprestado" alguns versos que aqui continuo a partilhar convosco, passeantes deste espaço.

Trago hoje a memória daquele que, no entender de Adalberto Alves citando Nykl em "O Meu Coração É Árabe", foi o mais notável dos poetas hispano-árabes: Al-Mu'tamid, o rei-poeta que morreu traído e desterrado em Aghmat, Marrocos. Da sua obra, que inclui o seu próprio Epitáfio, aqui fica o registo dum dos poemas de amor, sem título:  
                            
                                 ó minha única eleita
de entre toda a humanidade:
estrela! lua a brilhar!
haste erguida e escorreita
gazelita no olhar.
da flor tu és o alento
és a brisa perfumada,
minha dona, meu sustento,
e grilheta bem-amada.
cego ficaria e surdo
para que fosses resgatada.
chama-me! eu logo acudo.
diz-me! será curada
a ardência do meu coração
com o fresco toque dos dentes
que na tua boca estão?

in
"O Meu Coração é Árabe" de Adalberto Alves

terça-feira, dezembro 27, 2011

Pérolas Musicais de Aljezur

ADÉLIA ROSADO

Que pena não ter conseguido uma fotografia da prima Adélia Rosado, para ilustrar a sua voz que algumas vezes me embalou e que foi várias vezes recolhida por etnólogos.

Em sua memória aqui fica o seu registo finíssimo incluido nas recolhas de Michel Giacometti, e que veio influenciar tantas versões do mesmo romance por vários grupos e cantores, desde a Brigada Vítor Jara, Ronda dos Quatro Caminhos, Navegante e Eduardo Ramos, que lhe acentuou o sabor árabe e medieval.

Trata-se do Romance de Dona Mariana, também conhecido como de Dona Galaçua e de  Carlos de Montealbar.

Para ouvir com a atenção que merece, clique e dê um tempo

http://www.youtube.com/watch?v=KFZ9FZIlvjY

domingo, dezembro 04, 2011

A Magia da Paisagem

...pelos olhos de José Furtado Júnior


Muito pouco têm os media dedicado ao concelho de Aljezur, nem por bem nem por mal, não obstante os ilustres filhos da terra que, sobretudo no século passado, este cantinho deram à estampa em prosas e rimas várias.
Revolvendo coisas antigas lá em casa, passaram-me debaixo dos olhos uns recortes do Jornal do Algarve dos idos sessenta, onde um dos Furtados subscrevia uma apresentação romântico-etno-geográfica, a propósito da suposta visita de um forasteiro alentejano. Viagem que em três jornadas (e em três jornais), cobre a orla que vai desde a Praia da Amoreira até à impressionante e majestosa falésia de Martim Joanes.
Aqui ficam, in memoriam e com a devida vénia ao Sr. José Furtado Júnior, a digitalização dos recortes seguida da respectiva transcrição.




Gratas recordações dum encontro amigável
A Magia Eterna da Paisagem do Algarve
I
Há dias, vindo o signatário de calcorrear os seis quilómetros de estrada que separam a vila de Aljezur do Monte onde reside, foi alcançado por um automóvel que parou junto de si. O seu dono e único ocupante, numa atitude de franqueza, ofereceu-nos boleia que, pela espontaneidade patenteada, aceitámos com agrado, mas porque ambos fomos discretos, no cumprimento usual ocultámos os nossos nomes. Somente me disse o aludido senhor que era alentejano, e isto foi suficiente para iniciarmos conversa como velhos conhecidos, tanto mais que, ido ali pela primeira vez, manifestou prazer por encontrar quem lhe falasse das particularidades do ambiente, ficando eu satisfeito por me ser dada a oportunidade de dizer algo sobre o que cá temos de admirável e até agora pouco conhecido.
Com o carro em andamento moderado, chamei a atenção do meu recém-amigo para os vários panoramas que se divisam da estrada, que segue pelo alto dos montes, tendo a nascente e como pano-de-fundo a majestosa Fóia. Em frente o mar – esse divino Atlântico – sempre belo nestas paragens, além do mais pela própria cor cerúlea de perfeita limpidez.
Causou-lhe particular encanto a surpresa dum verdejante vale – os Salgados – prolongamento da ubérrima várzea de Aljezur, situado numa baixada onde se estão a desenvolver lucrativos milheirais e onde se cultivam, também em larga escala, o arroz, feijão, etc. Corre por ele em caprichosas sinuosidades a ribeira de Aljezur, cujas águas, em aparente quietude, se afiguram nesta época estival a um ofídio monstruoso, de cor limosa, apático pela existência de milénios…
Continuando a marcha devagar, entrámos nos médãos que antecedem a costa e como tudo agradou ao senhor alentejano, emitiu a opinião de que esta zona se presta maravilhosamente para uma larga exploração turística, não lhe faltando curiosos atractivos, tais como a vastidão do horizonte, abrangendo terra e mar; a quase planificação das dunas, permitindo, facilmente, construções de qualquer género, mas onde ficaria muito bem uma povoação tipicamente algarvia, como alguém, que bem conhece o turismo, aqui nos insinuou; dois pinhais-refrigérios sempre desejados para parques de recreio; água potável, elemento imprescindível para as numerosíssimas necessidades da vida; marginação com rio (designação dada à ribeira de Aljezur desde a foz até onde chega o fluxo das marés) abundante de peixe e onde se passearia de barco, depois de dragado como merece, neste sossego paradisíaco, único na costa ocidental do Algarve! Ao lado, contrastando a vista, existem grutas milenárias de austera aparência que o tempo não desfez.
Chegada a hora de retirar, despedimo-nos “até qualquer dia”, pois o senhor alentejano, já meu amigo, satisfeito com o que observara, prometeu voltar para ver mais e melhor.
Eu fiquei ao seu dispor para o acompanhar e levá-lo a diversos locais para apreciar toda a gama de belezas que a Natureza “intimamente” guarda aqui, por enquanto virgem da acção do homem que muito pode fazer em seu benefício, tornando esta ignorada costa num magnífico centro de turismo, aproveitando em larga medida os seus recursos naturais.

Monte Clérigo
José Furtado Júnior
(Publicado no Jornal do Algarve de 29JUL1967)




II
Cumprindo a promessa antes feita, breve regressou o senhor alentejano no seu trepador “Cortina”, muito satisfeito por irmos dar mais um passeio por esta ignoradas paragens, agora à beira-mar e num dia de agradável amenidade.
Deixando o carro no parque da praia do Monte Clérigo, fomos andando pela orla até à praia da Amoreira, passando junto de pescadores que, pelo propício estado do mar, tinham todos abundante pesca. Os pesqueiros situam-se no alto das arribas, o que causou admiração e susto, ao homem do interior, impressão que se desfez quando viu um sargo anzolado (coisa que nunca vira) bonito peixe desta saborosa espécie.
Ao chegarmos à praia, ampla, de areia finíssima (por aqui são todas assim) e cheia de sol, levei-o à “furna das gralhas”, grande caverna em contacto permanente com o mar, cujo marulhar, ecoando no espaçoso vão, com escassa luz, nele produziu tal admiração pelo ineditismo que, por uns momentos, perdeu a habitual comunicabilidade! De facto, aquele ambiente de severidade impressionante, leva-nos a pensar que somos pequenos ante a sua grandeza.
- Sim, senhor – disse o meu amigo com pasmo – vale a pena vir aqui, só para ver isto!
Na praia do Monte Clérigo, notou o senhor alentejano uma ondulação um tanto viva, de certo modo imprópria para tomar banhos. Objectei-lhe que aqui toma banhos quem quer e sem perigo, estes mais salutares pela constante vivacidade das águas, transmissoras de propriedades energéticas – o que mais se deseja dos banhos salinos - porquanto este poderoso elemento é, nesta costa, mar-mar e não mar-lago, como se vê noutras. Contudo, se algum dia isto se desenvolver como se espera, temos adjacente à praia, mas metido à terra, grande cavidade de forma ovóide, que bem se presta para magnífica piscina, embelezada com o que, na actualidade, se prepara para variadas recreações.
Também me falou da frescura atmosférica, diferente da que sentiu noutras praias. Confirmei, mas acrescentei que os ventos dominantes são, aqui, do norte e do noroeste e raramente temos do sul e do sueste, desagradáveis para nós. Mas quando alguma vez chegam aqui, surge a nossa viração que, “importunada”, sopra os “intrusos” com persistência, fazendo-os recuar para as suas proveniências transmitindo-nos, imediatamente, a sua consoladora frescura.
Sempre atento ao que via e às minhas sinceras explicações, subimos da praia para o medo, ao lado dumas engraçadas vivendas. Seguindo na direcção do sul, andámos e parámos de vez em quando para admirarmos a vista soberba sobre o mar, livre de impedimentos, duma luminosidade excepcional e em concordância falámos do que seria isto um dia se o dinheiro e o bom-gosto aqui chegassem! Não cabe aqui dizer! Perguntou-me a extensão aproximada desta faixa, desde a praia da Amoreira até ao fim da propriedade do Monte Clérigo, passando pela praia deste nome. Respondi que seriam, grosso modo, três quilómetros e a superfície de interesse turístico de cerca de trezentos hectares.
- Que lindo, que maravilha tudo isto – disse entusiasmado!
Como a tarde ia a findar, demos o passeio por terminado, ficando para terceiro e último a visita a outros sítios, igualmente encantadores. E lá partiu, o visitante, até outro fim-de-semana.


Monte Clérigo
José Furtado Júnior
(Publicado no Jornal do Algarve de 05AGO1967)



III
Conservando a curiosidade manifestada no nosso primeiro encontro, voltou o nosso bom amigo alentejano para concluirmos as visitas a esta zona privilegiada no seu dizer bem sincero.
Assim, lá fomos até ao ponto donde retrocedemos na última semana. Agora, aproveitando a maré-baixa, descemos, aos laredos (rochas desareadas) onde abundam mariscos – perceves, mexilhões, etc. – e o alentejano, das charnecas sem fim, via tudo com entusiasmo crescente! Nem escaparam à sua penetrante observação os soberbos alcantis, de autêntica rocha, de cor azulada, com desenhos admiráveis em camadas sobrepostas.
Andando lentamente para apreciar melhor, chegámos à Parede, sítio de céu aberto, tão admirável como a Furna das Gralhas. Aqui, a solidão é impressionante, acrescida do movimento das águas apertadas entre os rochedos.
O meu amigo, viu imediatamente um lugar propício para inspiração de poetas de temperamento anacorético, cujas obras, adequadas à imponência do conjunto seriam, na verdade, dignas do mais elevado apreço.
Indiquei-lhe e gostou de ver no cocuruto duma alta penedia um ninho de cegonha, pacífica ave e única habitante deste singular retiro, causando-lhe certa espécie de emulação instintiva a tranquilidade em que este animal aqui vive.
Depois de refeitos da caminhada, continuámos até à praia da Arrifana, ou da Fortaleza.
Esta, de características diferentes das anteriores, tem a vantagem de se prestar para a pesca, abrigada como está pela Ponta da Atalaia.
Aqui, esta indústria  processa-se, principalmente, sobre espécies graúdas e também a lagosta em larga escala. Para o efeito residem alguns pescadores cuja faina atinge, no Verão, acentuado movimento, resultando exportações valiosas.
Descendo para a praia encontrámos, casualmente, um pescador, meu conhecido e amigo que, de regresso ao seu barco, ia tratar duma caldeirada para o pessoal.
Imediatamente nos convidou para irmos comparticipar, amabilidade que agradeci com alegria, mais por proporcionar ao meu companheiro o prazer duma refeição abordo, que bem longe estava desta novidade. Lá fomos na chata até à lagosteira, onde a companha se empregava nos aprestos para a pesca nocturna. Deu-se início à caldeirada constituída por seis espécies, conjunto magnífico e bem condimentado que a tornou maravilhosamente sápida para o paladar mais exigente. Foi regada com vinho regional, especialidade que desconhecia e eu muito lhe agradou, gabando tudo merecidamente. A seguir, o meu amigo, proprietário do barco, teve a gentileza de nos oferecer um passeio pela baía, contornando a notável Pedra da Agulha, curiosíssimo fenómeno geológico perfilado eternamente, seguindo até defronte da alta falésia de Martim Joanes, cuja verticalidade de 100 metros muito o impressionou.
Retrocedemos para o ancoradouro vendo, por fim, o “viveiro” das lagostas, tudo ineditismos que o encantaram. Chegados a terra, o senhor alentejano certificou todas as boas impressões que colheu nesta digressão, confessou-se plenamente satisfeito e firmou que jamais pensara que nestes ignotos lugares existissem quadros naturais de tão exuberante admiração, dignos de serem mais conhecidos e propagados a bem do turismo!
E com gratas recordações como se diz na epígrafe, despedimo-nos com um abraço fraternal e mútuos desejos de repetidos encontros.

Monte Clérigo
José Furtado Júnior
(Publicado no Jornal do Algarve de 05AGO1967)

sexta-feira, setembro 16, 2011

Galeria de Aljezurenses

São coisas da Feira das Feiras, a dos Livros. Os olhos atentos perscrutam montras e prateleiras em busca de novidades ou de qualquer destaque, seja um cartaz, um nome, o livro do dia ou uma capa mais colorida.




Neste caso, o que teria sido?! A capa? Não, cores mornas; Um número? 200; ou o exercício mental de, perante aquele número, querer saber que 200 eram aqueles? 200 Algarvios;
as fotografias da capa? De fraco contraste mas algo familiares (a do Monsenhor Pardal).
Ingredientes agitados, prontos a usar: um “Who’s Who?” à portuguesa, ou melhor dizendo, à algarvia.
 
Já conhecia a Dra. Glória Maria Marreiros do seu ”Este Algarve, outro”, mas não o seu investimento na compilação destes 200 Algarvios que honraram a província e a elevaram para além das serranias.

A Dra. Glória selecionou para Aljezur quatro individualidades que se distinguiram em campos distintos e por razões várias, mas que se conjugaram na geração deste orgulho que é o de, pelo menos, partilharmos a sua terra de origem.








O livro contém as resumidas biografias destas quatro figuras, memórias vivas em alguns de nós. São eles:




Eng. Acácio de Calazans Duarte

(15/02/1889 – 31/05/1970
 em Marinha Grande)





Monsenhor Manuel Francisco Pardal

(27/12/1896 - 03/04/1979)







Calígrafa D. Zulmira da Costa Correia

(04/01/1912 – 23/12/1992)



Pintor José Rodrigues Cercas

(01/04/1914 – 05/12/1992)

















Apelo
Deixo aqui um convite a todos os leitores destas linhas: por favor enviem os vossos contributos (todos) para a criação da Galeria dos Aljezurenses que dalguma forma se destacaram.

segunda-feira, maio 02, 2011

Percebeiros (antigos e modernos)

Aqui fica o registo (alheio) com as lembranças do Moreira.
Dos antigos estão lá ele próprio, o João Serrote e o Arnaldo Claro, tanto quanto me foi possível identificar.
A actividade é a tal...

A autoria é de João Vagos (tiro o chapéu!) que no YouTube deixa o seguinte comentário:

"Olá amigos. Este foi um projecto piloto que nunca conseguimos financiamento para seguir em frente. Se alguém conhecer um produtor interessado em financiar este projecto, agradeço o contacto. Abraço. João Vagos."  (jvagos00)

domingo, abril 17, 2011

O Brasão de Aljezur


Retomando “Aljezur, Terra Mimosa” transcrevo o texto de Manuel Garcia sobre as armas da vila:

“Sendo Aljezur uma das sete vilas acasteladas (1), conquistadas ao Algarve por D. Paio Peres Correia, há 695 anos (2), até há bem pouco tempo não tinha brazão definido.
As sete vilas: Estombar, Paderne, Aljezur, Albufeira, Cacela, Sagres e Castro Marim, são os sete castelos que figuram no brazão de Portugal (1) e, realmente, era para estranhar que Aljezur ainda não tivesse, também, o seu brazão. A Portaria Nº 8:362 de 17 de Fevereiro de 1936, veio suprimir essa falta e define-o assim:

Bandeira: de Azul, cordões e borlas de prata e de azul, haste e lança dourada.


Armas: de prata com uma torre torreada mourisca de vermelho, aberta e iluminada de azul sobre um terrado de negro cortado por três faixas ondadas, duas de prata e uma de verde. O torreado, acompanhado em chefe por uma cabeça de carnação branca coroada de ouro e por uma cabeça de carnação negra com turbante de prata. Coroa mural de quatro torres de prata. Listel branco com os dizeres: “Vila de Aljezur”, de negro.

1)      1) Lembro que o livro foi publicado em 1938;
2)      2) Alusão aos setes castelos que integram o escudo nacional e que representam a unidade nacional conseguida com a conquista do Algarve. Aparecem pela primeira vez na bandeira de D. Afonso III, em 1248, e o seu número era variável, inicialmente de 16, passou a 7 apenas com D. João II, 240 anos mais tarde.

domingo, março 20, 2011

Turismo - Guia de Portugal

Viajar, nos dias de hoje, não representa qualquer dificuldade para a maioria dos classemedianos portugueses, mas tempos houve em que viajar era um privilégio de muito poucos.
Raul Proença teve esse privilégio e, esse privilégio foi-nos transmitido por podermos aceder ao seu Guia de Portugal, obra em que o mestre socialista e republicano publicou com as suas notas de viagens e estudos históricos e geográficos que fizeram desta obra um verdadeiro guia turístico. A primeira edição da Biblioteca Nacional de Lisboa, saiu em 1927.
 
Como curiosidade, deixo aqui em excerto as poucas linhas dedicadas a Aljezur a pp. 309:


"Aljezur, vila pequena e pobre, com 4160 hab., sede de conc. (Hosp. Margarida Pardal, Maria Matos; dia fer. 29 de Agosto), tomada aos Mouros por D. Paio Peres Correia no reinado de D. Afonso III. D. Dinis deu-lhe foral em 1280, que D. Manuel renovou em 1504. Fica na encosta E. dum escarpado cerro, em cuja base passa a ribeira de Odesseixe (deve ser a ribeira de Aljezur).  Do castelo mourisco apenas se conservam hoje algumas ruínas, na parte mais elevada da colina, ao S. Aljezur é tida como o sítio mais insalubre do Algarve (febres intermitentes).
A 6 km. de Aljezur as praias do Monte Clérigo e da Pipa; a 7 km. a da Arrifana, ou da Fortaleza."

E algumas páginas mais adiante (pp. 320):

"Ao N. da Ponta da Carrapateira estende-se a vasta praia desse nome. "Passada a praia, eleva-se outra vez a terra até a Arrifana. A enseada da Arrifana fica entre duas pontas: ao N. a da Arrifana; perto da ponta S. a Pedra da Anixa. Ao N. da Ponta da Arrifana a foz da ribeira de Aljezur, e ainda a N. a de Odesseixe. A costa é por ali tão alcantilada e o mar tão encapelado que nem os pescadores lhe podem chegar. Os pobres habitantes destes sítios, com muito risco de vida, pescam algum peixe para seu mesquinho sustento e apanham os perseves que por estas rochas desde o cabo se criam. Nestas também se encontram grandes mexilhões. Há grandes furnas por esta costa."