terça-feira, agosto 09, 2016

PORTUGUÊSmente

Falar português ou estrangeirês? Português, empresariês, farmaticês.

Há muitos, muitos anos, que leio bulas de medicamentos. O que lá procuro? Pois por dentro dessa linguagem tão específica, aprendi a distinguir a Posologia, os Efeitos Secundários e pouco mais. Estes folhetos têm melhorado muito ao longo do tempo, adoptando, pelo menos nestes parágrafos, uma linguagem mais comum, mais facilmente entendível.

Mas e a imprensa?! Exige à partida uma familiarização com diversas terminologias, igualmente específicas, em textos obviamente destinados a diversas categorias de leitores, mas nem por isso afastam os leitores mais vulgares.
O Português é uma língua riquíssima, dispõe da palavra certa para cada situação, mas a moda de importar termos quase sempre de origem anglo-saxónica, é levada a um exagero insuportável. E então na área das tecnologias até já levou que os amigos brasileiros introduzissem o termo mídia, na ânsia de assumirem as sugestões da mal-pronunciada media (em inglês).

Seguem alguns exemplos, extraídos apenas de um exemplar de um conhecido e conceituado semanário da nossa praça jornalística. Tão somente num artigo do seu suplemento de Emprego extraímos as seguintes frases… assim como estão, sem (necessidade de) contextualização:
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…possivelmente a aproximarmo-nos de um esgotamento ou, como se diz agora, de um burnout!...
…conhecimento de Supply Chain e do modelo Lean Manufacturing, visão integrada de negócio (com todos os stakeholders).
A empresa Xyz é uma startup avaliada em mais de mil milhões de euros.
…formar jovens talentos que integrarão o Plug-In, o primeiro programa de trainees.
A senhora lidera uma equipa que prefere lhe chamem a “People Team”.
…e há uma equipa que se dedica em exclusivo a potenciar o bem-estar e motivação e que se designa “Make it Happen Team”.
…as vagas estão abertas para “Senior .Net Developers”, “DBA’s” “Performance”.
…diferentes perfis Software Testers”, “QA Automation”, ”Dev/Ops”, “Performance Engeneers”, “Release Engeneers”, “Scrum Masters”, “Product Owners”, “UX”, “Digital Designers, e ainda, “People Business Partners, Talent Acquisition Specialists”, “Account Managers”, “Customer Services Agents”, fluente em línguas (?) Operations e Finance.
Os seleccionados devem especializar-se em áreas como Quality Assurance Automation, UI Development e .Net Development.
…o programa cumpre um plano de formação comportamental (soft skills) e formação on-job complementar.
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No mesmo suplemento, mas num outro texto sobre Seguros vem dizendo:
Tornar as estruturas mais leves no que concerne aos workflows internos…;
…o sector tem mais funções de new business ou business development…;
…apostar mais em profissionais focados em employee benefits.
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Hábito ou presunção?
Para já não falar na restauração. Desapareceu a profissão de cozinheiro e agora todos são chef, sem o e final, para não se confundir com qualquer designação hierárquica.
E até várias associações e empresas neófitas se constituem com nomes em inglês, mais sonantes, sobretudo quando se referindo às suas áreas de actividade. Como se a língua portuguesas não dispusesse dos vocábulos adequados ou, se os usassem, corressem o risco de não virem a ser compreendidos.

Então porquê as lamentações de que o ensino do português em países doutras expressões está a perder o interesse? Se no próprio país a sua utilização é “com toda a propriedade e facilidade” ultrapassada pelos termos da moda.

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