quinta-feira, novembro 11, 2010

Aljezur, Terra Mimosa - 2


Revisitando o livrinho, como prometido, deixem-me partilhar convosco este épico sobre a nossa vila e seus termos, na perspectiva do seu autor, Manuel Garcia, que os incluiu no capítulo “Simplicidades Regionais”.

Tomai fôlego para as 15 estrofes:

Aljezur Histórico
“Esta é a ditosa pátria minha amada
A qual, se o céu me dá, que eu sem perigo
Torne com esta empresa já acabada.”
Camões
Tinha o nome de Algazur antigamente
Que significa: arcos, arcada ou arcaria.
E vem dos árabes, raça de povo ingente
E segundo a história, essa etimologia,
Fala numa manhã de Junho a tradição,
Citando, da história, o facto heróico e belo
Dos lusos porem nas ameias do castelo
O seu lindo pavilhão.

A vila foi submetida aos portugueses
P´lo grande chefe da Ordem de Santiago
Que mereceu dos seus feitos, muitas vezes,
Louvores grandes e justos em areópago.
E foi tanta e tão grande sua acção guerreira
Que sete vilas foram assinaladas,
No Escudo, Aljezur é das mencionadas
Na nossa querida bandeira.

Os homens de antanho não podem precisar
Se foram bem os mouros os seus fundadores,
Pois, na província que se chamou Al-faghar,
Outros povos houve que foram senhores.
Dominaram os romanos, a sua capital
Foi Ossonoba, cidade das mais esbeltas,
Inda havendo, em Aljezur, vestígios celtas
A dúvida é natural.

Os mouros, no entanto, foram povo audaz,
Muito contribuiu p´ra civilização
E que vincou duma forma bem eficaz
O seu engenho e arte com muita atenção,
Tinham a agricultura como seu programa,
Teve o seu tempo, muita fama, muita glória,
Ainda hoje o povo tem na memória
Essas lendas da mourama.

E quem é que não tem visto por toda a parte
Os engenhos desse povo do oriente
Que demonstrou bastante na sua arte
Ser, nessa época, do mais inteligente?
Pois eles seguiram sempre o seu bom caminho
P´las coisas práticas, sem nenhum sobressalto,
Inda hoje é bem poético ver lá no alto
Umas velas dum moinho!

Em muitos lugares se vão ainda encontrar
Alguns vestígios, ainda muito assinalados,
Doutros povos que chegaram  a fabricar,
Vários utensílios, em tempos já passados.
Para barlavento, junto ao litoral,
Uns indícios de povoações se descobre,
E, próximo da vila, uma mina de cobre,
Ao pé do Vidigal (a).

Parece que outrora teve preponderância
Este concelho, no seu comércio comum,
Com outros povos, e que com certa abastança,
Na faina da pesca, teve armações de atum.
E até que já no tempo da mauritana,
Essa tão grande e próspera comunidade,
De facto auferiram essa prosperidade
Na marítima Arrifana.

Em Aljezur, dizem crónicas do passado,
Houve um desembarcadouro para aportar.
No “tombo” do concelho, isto já vem citado
E outros documentos mais a confirmar,
Referindo-se a “um combro dum lizeirão,
Que servia de porto”, isto em remotos anos,
E que até os conquistadores lusitanos
Foram de embarcação (b).

Já o domínio dos mouros tinha passado
E já lá ia bem longe o seu ritual
Quando o rei luso D. Diniz, no seu reinado,
A Aljezur concedeu honras e foral,
Até determinou que os homens primeiros
Nunca no exército iriam à retaguarda,
Mas que marchassem sempre na vanguarda
Os mais nobres cavaleiros.

Foi dada em doação à ordem militar,
Com título de honrada, p´lo rei venturoso
Que nomeou alcaide-mor o titular
Conde de Vila Verde, lugar muito honroso.
Segundo a história, devido à inveja,
Essa honra de alcaide-mor do castelo
Passou mais tarde a ser título belo
Do Marquês de Angeja.

Tinha força militar, uma companhia,
Ordenanças, oficiais, um capitão;
Corporação que a ordem lhe competia,
Assim como também a pacificação.
E relevantes serviços tinha prestado,
Pois que sempre as tradições ela muito honrou
Dos lusos valorosos, até que acabou
Já no século passado.

Quando do terramoto no tempo do marquês,
 A vila também sofreu dessa convulsão,
Do mais fidalgo ao humilde camponês,
Ficaram uns sem vida e outros sem pão.
Fenómenos de desgraça, coisas horrendas,
Segundo testemunhas que o mesmo viu,
Pois até desapareceu a água do rio
Porque este abriu fendas.

Este povo tem passado vicissitudes
Que têm contribuído para o seu mau estar
E se não fosse um homem de altas virtudes
Mais teria ele ainda que lamentar.
Dizem que, há documentos que isso prova,
Quis fazer de Aljezur a sua pupila,
Pois convidou o povo a transferir a vila
Para a sua Igreja Nova.

Chegou até a uma certa decadência
Verificando-se isto já nos nossos dias
Quando lhe tiraram a sua independência
Firmados, creio, em hipotéticas teorias.
Foi um desânimo, uma desolação
Que o povo teve, no entanto reagiu
Trabalhou com persistência, mas conseguiu,
A sua restauração,

Hoje que já se vislumbra uma nova aurora
A q’rer iluminar a tua região
É porque não vem longe o dia e a hora
Que possas mais alto erguer o teu pendão.
Deves afastar velharias do passado,
Passado que não deixa por certo saudade,
Para que sigas avante à prosperidade
Já tens caminho rasgado.
   
(a) Diz a tradição que, em tempos remotos, foi uma grande povoação, tinha o nome de Vila Verde. Ali se têm encontrado vários objectos antiquíssimos como moedas, coisas de barro muito rudimentares e seixos redondos com uma capa de chumbo, fazendo as vezes de balas.
(b) Na vila e suas proximidades não há indícios de porto ou desembarcadouro; no entanto a tradição diz que D. Sancho II desembarcou tropas no sítio que ainda hoje tem o nome de Vale de D. Sancho.

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