“Contrato, contrato, contrato fazemos” e enganchávamos os dedos mindinhos da mão direita, sacudindo os respectivos braços num sobe e desce ao ritmo da ladainha, e continuávamos “Sábado de Aleluia desmancharemos e Domingo de Páscoa nos pagaremos!”, se não me falha a memória, logo depois dos toques das matracas, numa excitante esconde e busca. Era assim na Semana Santa, uma tradição que cumpríamos desde pequeninos, começando com os adultos da casa ou da vizinhança, passando à fase dos colegas da escola e por fim, praticando (reminiscências) com as namoradinhas ou com aquelas que gostaríamos que viessem a ser.
Li num destes dias que em algumas localidades o prémio era um saco de amêndoas. Admirei-me, pois saco de amêndoas era uma coisa que, se aparecesse lá por casa, era único e maternalmente administrado para chegar para toda a família. Os nossos eram apenas confeitos, uns pequenitos que tinham um pinhão dentro. Com o seu justo ou exagerado aumento de valor, tem vindo a ser substituído por um grãozinho de alcagoita.
As procissões, com o respectivo sermão no Largo da Câmara (antiga), levavam ao êxtase a população religiosa da vila. Eram sobretudo mulheres, e alguns dos homens parecia estarem presentes apenas por dever ou imposição, funcionários ou “forças vivas”, vestiam as opas e transportavam os andores, exibindo as suas melhores fatiotas.
Mas apesar de não participarem nas celebrações religiosas, os homens não deixavam de afunilar as pernas em cotim novo, e as botas, com fileiras de cardas novas, a bater a cadência nas calçadas.
Há memórias neste texto que só vim a compreender uns anos depois dos “contratos”, quando a minha mãe, mais uma vez não resistindo às minhas insistências, teve de me costurar umas calças novas de cotim militar, com bolsos cortados e tudo, para eu estrear na feira do Rogil, ou melhor dizendo, no baile da feira do Rogil, para onde me desloquei... a pé, claro!
Tinha aquela fé no profano, pois a feira do Rogil nem sequer é na Páscoa!
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